20/03/2012

Alain de Benoist - Dinheiro

por Alain de Benoist


Claro, todo mundo prefere ter um pouco mais do que de menos. “Dinheiro não compra felicidade, mas contribui com ela” – como diz o ditado. Precisamos encontrar, entretanto, o significado de felicidade. Max Weber escreveu em 1905: “Um homem ‘por natureza’ não deseja ter mais dinheiro; ele apenas quer viver conforme é acostumado a viver, e ganha o quanto é necessário para isto.”

Numerosas investigações apontaram um contraste relativo entre o padrão de vida crescente e o nível de satisfação entre indivíduos. Passado um certo limite, ter mais dinheiro não significa ter mais felicidade. Em 1974, em seus estudos, Richard Easterlin estabeleceu que o nível médio de satisfação expressa pela população manteve-se virtualmente imutável desde 1945, apesar do espetacular aumento na riqueza de países desenvolvidos. (Este “paradoxo de Easterlin” tem sido recentemente confirmado) O fracasso em medir crescimento material, assim como o PIB, para avaliar o nível do real bem-estar, é também muito notado – especialmente o nível de uma certa comunidade. Não há um serviço para escolhas indiscutíveis que seria capaz de calcular as preferências individuais em termos das preferências sociais.

É tentador ver o dinheiro como uma ferramenta de poder. Infelizmente, o antigo projeto de separação radical entre poder e riqueza (um é mais rico e poderoso) continuará a ser um sonho. Uma vez o homem foi rico porque era poderoso; hoje ele é poderoso porque é rico. O acúmulo de dinheiro tem rapidamente se tornado não o significado de expansão de mercado (como alguns acreditam), mas o objetivo da produção de commodities. O capitalismo não tem outro objetivo senão o de lucro sem limites e de acúmulo interminável de dinheiro. A habilidade para acumular dinheiro obviamente dá poder discricionário para aquele que a tiver. Especulações com dinheiro dominam o governo mundial. O banditismo especulativo mantêm o método preferido do acúmulo de riqueza capitalista.

O dinheiro não devia ser confundido com moeda. O surgimento da moeda pode ser explicado com o desenvolvimento do intercâmbio mercantil. É somente pelo comércio que os objetos adquirem sua dimensão econômica. E é também pelo comércio que o valor econômico é obtido com completa objetividade, dado o fato de que bens comercializados devem beirar o lado subjetivo de um ator singular – assim esses bens podem ser medidos em termos da relação entre diferentes atores.

Como um equivalente geral, moeda é intrinsecamente um fator de unificação. Reduzindo todos os bens a um denominador comum automaticamente torna o comércio homogêneo. Aristóteles já tinha observado: “Todas as coisas que são comercializadas deveriam ser de alguma maneira comparáveis. Com esse propósito, a moeda foi inventada, que mais tarde se tornou, de certa forma, um intermediário. É uma medida de todas as coisas”. Criando uma perspectiva da qual a maioria das diversas coisas pode ser valorizada com simples números, a moeda torna tudo “igual”; a moeda, portanto, reduz todas qualidades de distinção mutualística a uma simples lógica de “mais e menos”. Dinheiro é o padrão universal que garante a equivalência abstrata de todos commodities. Como um equivalente geral, reduz toda qualidade à mera quantidade. O valor de mercado é somente capaz de diferenciação quantitativa.

O Monoteísmo do Mercado

“A lei do dinheiro, escreve Jean-Joseph Goux, é o reino de medida única da qual todas coisas e atividades humanas podem ser avaliadas... O que observamos aqui é a “mentalidade monoteísta” em relação a noção de valor como equivalente geral para todas as coisas. Essa racionalidade monetária, baseada em um simples padrão de valor, é totalmente consistente com a “univalência teológica”. Isso pode ser chamado de lei “monoteísmo de mercado”. O dinheiro, escreve Marx, é como uma commoditiy, que leva a uma total alienação porque produz alheamento global de todas as commodities”.

O dinheiro é muito mais do que apenas dinheiro – e seria um grande erro acreditar que o dinheiro é “neutro”. Não menos do que a ciência, não menos do que a tecnologia e linguagem, o dinheiro não pode ser neutro. Vinte três séculos atrás, Aristóteles observou que “a necessidade humana é insaciável”. Bem, “insaciável” é a palavra certa; não há nada suficiente. E sim, porque nunca será saciável, nunca se terá superávit. O desejo por dinheiro é um desejo que nunca poderá ser satisfeito porque alimenta a si mesmo. Qualquer quantidade dele, seja o que for, deve ser acrescentada ao ponto em que melhor deve sempre significar mais.

A coisa, a qual se pode ter sempre mais, nunca se terá o suficiente. Essa é a razão do porque as antigas religiões européias continuamente advertiam contra a paixão pelo dinheiro:

O Mito Gullveig na Mitologia Nórdica

O Mito de Midas

O Anel de Policratos

O Crepúsculo dos Deuses (“Ragnarök”)

Todas essas foram consequências do desejo pelo dinheiro (a “Maldição de Rheingold”). “Nós estamos correndo perigo”, Michael Winock escreveu poucos anos atrás, “de ver o dinheiro e sucesso financeiro como o único padrão de prestígio social, o único propósito de vida”. Aqui estamos agora. Hoje em dia, todo mundo almeja dinheiro ao redor do mundo. O Direitismo tem sido por anos seu maior servente devoto. A Esquerda institucional, sob o guia do “realismo”, esposou os princípios da economia de mercado – quer dizer, a administração liberal do capital. A linguagem da economia tem se tornado ubíqua. O dinheiro se tornou rito de passagem obrigatório em todas as formas de desejo que eles expressam no registro de comércio.

O sistema monetário, entretanto, não durará muito mais. O dinheiro será destruído pelo próprio dinheiro – por hiperinflação, bancarrota e hiperdébito. Provavelmente, se compreenderá com isto que só se pode ser rico pelo que se dá aos outros.