18/01/2014

Colin Liddell - O Último Samurai

por Colin Liddell



Segundo Steven Pinker (e uma grande quantidade de dados plausíveis reunidos pelo cientista social verborrágico e de cabelos esvoaçantes em seu último livro Os Melhores Anjos de Nossa Natureza) nós estamos vivendo em um mundo onde a guerra encolhe de forma gradual, porém inexorável, como os lendários Reis de Punt, cada um dos quais supostamente menor que seu pai.

Essa tendência, ao invés do poder dos russos, pode ter sido o que estava por trás da decisão do Presidente Obama e do Primeiro-Ministro Cameron de recuar em relação a Síria ano passado. Essa é a mais terrível guerra da atualidade, mas ela ainda é essencialmente uma questão local e uma minúscula espinha no brutalitômetro que mede os poderosos ápices do passado.

A nível individual, o nível que Pinker obviamente mais valoriza, a guerra é um grande desperdício. E ele pode ter razão, já que uma das piores coisas sobre ela é que ela seleciona negativamente - e abate - os melhores, mais corajosos e os indivíduos mais altruístas, as próprias pessoas que fazem qualquer sociedade ter sucesso.

Mas ela também é o teste máximo de um povo e sociedade, desde que os líderes saibam o que estão fazendo. Uma das principais tragédias da Segunda Guerra Mundial foi que no caso da Alemanha e do Japão eles obviamente não sabiam, de modo que a incrível bravura, disciplina, resistência, e espírito de sacrifício de seus soldados comuns foi finalmente desperdiçada.

É, portanto, com um pouco de tristeza - mas não muita, já que ele tinha 91 anos  - que soubemos hoje da morte de Hiroo Onoda, o soldado japonês que famosamente se recusou a se render quando seu país o fez, escolhendo ao invés seguir lutando com uns poucos colegas nas selvas da Ilha Lubang nas Filipinas até 1974, quando ele se rendeu sozinho e apenas após seu oficial comandante foi levado de avião para rescindir sua ordem original de não se render. Após isso houve uma cerimônia de rendição com o Presidente Ferdinand Marcos e então um retorno heróico ao Japão.

A guerra é uma iniciativa multifacetada que demanda uma grande amplitude de habilidades e atributos, mas mais do que a habilidade barulhenta e brilhosa de invocar campos de fogo, abalar a terra, acelerar a taxa de extermínio, ou até conquistar corações e mentes, é a simples, até mesmo teimosa qualidade de se manter firme segurando a arma, mesmo que ela esteja enferrujada, sem balas ou seja feita de bambu. Essa é uma qualidade que Onoda tinha de sobra. O escrito podia estar no muro, mas ele escolheu mijar no muro.

É relatado que ele ignorou diversas tentativas de fazê-lo se render, incluindo uma envolvendo panfletos jogados pelo governo japonês. Ele disse que os desconsiderou devido a erros gramaticais que ele pensou as desmascaravam como um complô americano.

Obviamente, tal teimosia não é suficiente por conta própria - e é claro que Onoda e seu cada vez menor bando de homens não representavam ameaça para o Estado filipino do pós-guerra - mas sem tal qualidade mesmo o maior poder de fogo sobre a terra pode se provar inadequado.

Uma das razões pelas quais Onoda foi tratado como herói no Japão foi o tempo de sua rendição. Ela veio em uma encruzilhada importante, dois anos depois do retorno dos americanos à ilha de Okinawa no Japão e logo em seguida a sua derrota pelos vietnamitas, um povo que os havia derrotado por um emprego similar de teimosia. O envolvimento direto dos EUA no Vietnã acabou em 1973 com os Acordos de Paz de Paris.

Se Pinker está certo e a guerra é, como a incineração de gatos, as execuções públicas e a tortura medieval, mais uma vítima do "processo civilizatório" que ele descreve, é improvável vermos homens como Onoda novamente, mas uma coisa que seu exemplo nos ensina é que, mesmo em tempos de suposta paz, um homem pode decidir continuar a lutar, com seus próprios meios, por tanto tempo quanto ele deseje.